De manhã, às vezes à tarde, faço minhas caminhadas pelo Parque da Água Branca. Uso pedômetro para marcar distância, de modo que caminho ou corro da porta do meu prédio até a volta, sem parar.
Andando no Parque eu passo por muita gente conversando e ouço, involuntariamente, pedaços de conversas descomprometidas.
Ou então:
“Menino, não mexe com o pavão que ele pode bicar!”
Existe uma frase materna mais ou menos frequente de mães de crianças muito novas:
“Não corre se não você cai!”.
Geralmente, isso acaba sendo uma missão subliminar para a criança: não corra, não assuma riscos, ou então caia para me deixar feliz.
Mas existem frases que ouvi que me marcaram pelo seu inesperado. Como aquelas duas moças de quem ouvi, ao passar por elas:
“Mas se você põe na boca ele fica duro!”
Ao que a outra respondeu:
“Mas se você continuar chupando ele amolece.”
Não foi indiscrição minha; elas andavam despreocupadas, a mais de um metro uma da outra, falando alto. Se não falavam de uma nova goma de mascar, o surpreendente era a naturalidade com que conversavam para quem quisesse ouvir. Passei por elas e não sei como terminou a conversa.
Um outro dia havia duas moças com um rapaz, uma de cada lado dele, andando devagar e conversando despreocupados. Tive de esperar que abrissem uma brecha para eu passar, já que os três bloqueavam a passagem. As duas riam para ele e o rapaz olhava para baixo, enquanto andavam.
Uma delas perguntou:
“Mas você é mesmo capaz de dar conta de duas ao mesmo tempo?”
Aí foi quando consegui ultrapassá-los e reparei que ele estava muito encabulado, por isso tinha a cabeça baixa. Respondeu, com uma voz insegura, antes de eu deixá-los para trás:
“Ah, eu acho que sim. Se vocês querem...”
Mas a mais surpreendente conversa cujos trechos eu ouvi, assim de passagem, no Parque, foi ontem. Em frente ao Recanto dos Idosos, as veredas são estreitas e não dá para duas pessoas passarem ao mesmo tempo sem que cada uma se vire para ceder espaço à outra.
Eram duas moças meio mulatas e atraentes – diria eu, meninas, dessas de 14 a 16 anos, no auge do fervilhar dos hormônios – vestidas de modo discreto (jeans) e modesto. Conversavam, entreolhavam-se e riam uma para a outra enquanto uma delas filmava a outra com um celular, como se fosse uma entrevistadora.
A entrevistada fazia pose de artista ao falar, mas interrompeu o que ia dizer quando me viu aproximando-me delas para passar. Eu apenas ouvi a palavra final do que dizia para a outra:
“....agropecuária...”
Dei a volta no jardim, como sempre faço, e depois retornei sobre meus passos para continuar a caminhada. As duas vinham vindo do ponto em que eu cruzara com elas e uma terceira moça encontrou-as, cumprimentando-as com um tapa na mão levantada de cada uma. Elas pareciam agitadas e alegres, como se estivessem excitadas com alguma novidade.
A que fizera a gravação estava observando o display do aparelho, enquanto a outra parecia explicar algo à recém-chegada, quando passei por ela. Provavelmente contando o que acabara de gravar:
“O meu avô tinha uma fazenda e ele era totalmente focado na agropecuária. Mas nos últimos anos tudo mudou e...”
Não ouvi o resto. Continuei minha caminhada até as baias ao lado da Francisco Matarazzo e, uns quinze minutos depois, eis que as três vinham, saltitantes, rindo, animadas. E, ao passar por elas, ainda ouvi não sei qual delas falando, com ênfase:
“É a evolução do agronegócio, mas a palavra-chave hoje é sustentabilidade!”
E aí não ouvi mais.
PMA 20/6/10
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