sexta-feira, dezembro 18

Lula acerta, Obama decepciona: o quê está em jogo em Conpenhague



matéria de 18/12/2009


Lula acerta


Todos sabem que não sou adepto do Lula, mas esta foi uma das vezes em que ele acertou. Tirou os óculos, botou de lado o papel e falou de improviso (um improviso maduro na cabeça dele) e acabou dizendo o que precisava ser dito. É preciso salvar o Planeta, ajudar os pobres, reduzir as emissões de carbono, etc. e tal, mas com respeito aos mais fracos e ao princípio da soberania das nações.

Lula foi aplaudido com calor quando disse esperar de Deus ou de um milagre o que deve ser feito para salvar o mundo. Não foi um discurso otimista e róseo, foi realista. Encurralou os Estados Unidos e os países ricos nas suas posições já conhecidas. E ainda ofereceu ajuda financeira, se necessário, da parte do Brasil, para ajudar os países ricos a ajudarem os pobres.

Tenho minhas ressalvas gerais a essa oferta, mas ela foi bem colocada, logo antes do discurso do Obama. Demonstrou que um país não-rico, o Brasil, está disposto a fazer sacrifícios pelo bem de todos. A pergunta que ficou no ar foi: e agora, o quê o país mais rico e mais poluidor do mundo está disposto a oferecer?

Entra Obama - e decepciona


Aí veio o Obama e reafirmou o que todos sabiam desde antes da conferência.

Vamos ser justos para com o Obama. Ele tem limites constitucionais e problemas no Congresso americano para obter autoridade de firmar um acordo de limites de emissões de carbono. Admitamos que ele tenha feito o possível e que continuará fazendo. Admitamos sua sinceridade e suas boas intenções.

Mas o que está em discussão é a posição da nação que ele representa, não as intenções. E, mais uma vez, os Estados Unidos, primeira e única potência mundial, demonstaram que não têm condições para exercer a liderança global para a qual foram chamados pela História. Visam apenas a seus interesses particulares e provincianos.

Obama reafirmou o que antes já havia sido discutido e fracassado como base de acordo, apenas isso, mais um acréscimo (que a Hillary Clinton havia adiantado dias antes): eles topam pagar os dez bilhões de dólares de que se falou até agora, mais - se os outros países concordarem por ecrito - 110 bilhões até 2020. Esse "concorderem por escrito" significa "transparência", no dizer de Obama, ou seja: supervisão por um organismo internacional, necessariamente financiado e controlado pelos Estados Unidos, das políticas internas dos respectivos signatários que possam influenciar na emissão de carbono - ou seja, tudo.

Quanto aos Estados Unidos, eles não estariam sujeito a controle algum. Prometem reduzir em 3 a 4% as emissões de carbono (sobre a base de 1990), o que é muito pouco, sem compromissos nem controles.

Trocando em miúdos: na cabeça dos americanos, a soberania das nações menos desenvolvidas e a constitucionalização da hegemonia americana hoje está estão estimadas em 110 bilhões de dólares. Quem dá mais, quem dá mais? Se alguém, que se apresente, que eles cobrem. Pois não gastaram seis ou não sei mais quantos trilhões de dólares só para salvar os bancos em 2009?

O resto do mundo vale pouco. Razão teve o Hugo Chavez quando, no seu discurso há dias trás, afirmou, com aplausos do plenário: "Se fosse para salvar bancos em vez do Planeta, esse problema já estaria resolvido".

Eu esperava mais do Obama e menos do Chavez.

O que está, realmente, em jogo

Fica claro então que o que está realmente em jogo não é a salvação do planeta, nem o volume de dinheiro que isso custa, nem a redução do efeito estufa ou qualquer uma dessas baboseiras ecológicas - ou, como diriam os americanos mais conservadores, os "tree-huggers".

Trata-se de um jogo bruto, mal intencionado, onde os atores são marionetes manipuladas por ninguém e por interesses vários, onde as intenções são irrelevantes e o sistema vai rodando as engrenagens num moto contínuo a partir de um impulso inicial que agora não se consegue parar. Antigamente, usavam-se as palavras "Imperialismo Americano", ou, depreciativamente, "Imperialismo Ianque". Com a globalização, essas palavras cairam em desuso e hoje são politicamente ultrapassadas. Mas só as palavras.

O que está, realmente, em jogo, é o Poder.

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