Os mortos-vivos sempre voltam
A gente viu eles se desfazerem bem na nossa cara. Mortos. Eles resistem a ser enterrados. Zombis políticos. Um dia voltam.
Os mostos-vivos sempre voltam. Assombram a gente. A gente pensa que eles morreram e perdoa. Não se fala mal de defunto, não pega bem. Então, deixa prá lá. E então eles voltam.
Estava eu fazendo uma faxina nas velhas coisas empoeiradas de um armário antigo quando me deparei com umas poesias que cometi em 2001. Estavam esquecidas, pois pensava eu que esquecidas sempre estariam.
2001. Vocês lembram? No Senado, o escândalo da violação do segredo do voto dos senadores, a revelação de um conluio entre... ah! deixa prá lá. São coisas passadas. Só que quem disse que águas passadas não movem moinhos estava errado. Os moinhos continuam girando com a corrente das águas passadas.
Mas nada disso vem ao caso. Trata-se apenas de uma recordação poética que quero compartilhar com os que me toleram. Qual a gravidade de uma violação do painel do Senado perto do que se faz hoje abertamente à vista de câmeras de TV?
Em 2001, movido pelo respeito e reverência que a dignidade de nossa Casa Legislativa maior, o Senado, inspira a todos os brasileiros conscientes, fiquei embaraçado com a exploração que a imprensa, sempre sensacionalista, secundada por políticos oportunistas, faziam às custas da honra dos nossos ilustres representantes.
Então escrevi esta homenagem para reivindicar o Certo e o Verdadeiro:
Apanhado em flagrante o desgraçado,
A justo e ofendido ele é metido.
Sacode os anéis o descarado,
Mas é excessivo o desmentido.
Incréu de conveniência e mentiroso,
Braços em cruz, em gesto escancarado,
Agitando a papada, o melindroso
Proclama em tom alto e fogoso:
“Sou um inocente injustiçado!”
Deseja ser um santo o estupor,
Mas não passa de um reles senador.
18/4/2001
Achávamos que eles estavam mortos. Para escapar do enterro, renunciaram à vida antes das exéquias. Pena. Morto não volta mais. Ou volta?
Por ocasião de seu afastamento do mundo dos vivos, eles ofereceram pérolas de eloquência e denodado amor à Verdade em seus discursos de despedida. Para captar a essência do pensamento vivo de cada um, resumi então, em poucas palavras, o que eles disseram em muito mais numerosas palavras:
Do Ilustre Presidente:
A Maldade e Rancor da feroz gente
Procura condenar um inocente:
Nada fiz, recém cheguei, sei de nada.
Mentira contra mim foi assacada,
Contra ela minh’alma é revoltada!
Do Relativamente Inocente:
Eu mesmo me apresento já rendido
Aos fatos e me digo já culpado.
Mas tenho a repetir um só pedido:
Considerem que estou arrependido,
Perdoem, se acaso condenado.
Do Truculento Que Não Mente:
Todos sabem que sou um impoluto.
Quem não acha, por que acha diferente,
Vai ter de se explicar: por que é que mente?
Contra Mal e Mentira sempre luto,
E prá quem disser que não, respondo: “Rima!” 8/5/2001
Adeus. Despedimo-nos deles e perdoamos. A gente sempre perdoa os que se foram. Como exercício de memória, deixo ao leitor a tarefa de identificar os autores dos agradecimentos acima resumidos.
Mas os mortos-vivos sempre voltam. Todos eles voltaram. Não faltou nenhum. Depois de tudo, a gente esqueceu. A gente votamos neles de novo. E a gente continuamos reclamando do mau cheiro dos defuntos.
A questão é que esses mortos continuam vivos, como sempre foram.
Os otários somos nós.
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